Papa Francisco: “paróquias demasiado autorreferenciais”, não ao “neoclericalismo defensivo”
O Papa Francisco concluiu a Assembleia da CEI recebendo em audiência os representantes diocesanos do Caminho Sinodal Italiano. Não à autorreferencialidade e ao neoclericalismo defensivo. Na Igreja às vezes há “excomungados a priori”. “Levar a sério a vulnerabilidade” e “ser uma Igreja inquieta.”
A reportagem é de Michela Nicolais, publicada por SIR, 25-05-2023. A tradução é de Luisa Rabolini.
“Às vezes tem-se a impressão de que as comunidades religiosas, as cúrias, as paróquias ainda sejam demasiado autorreferenciais”. Foi denunciado pelo Papa Francisco, recebendo em audiência na Sala Paulo VI os participantes no Encontro nacional dos Representantes diocesanos do Caminho sinodal italiano, no último dia da Assembleia dos Bispos italianos.
“Parece que se insinua, de forma meio escondida, uma espécie de neoclericalismo defensivo, gerado por uma atitude temerosa, pelas queixas de um mundo que já não nos compreende mais, pela necessidade de reiterar e de fazer sentir a própria influência”, advertiu Francisco, que voltou a estigmatizar a autorreferencialidade como “doença da Igreja” e avisou: “o clericalismo é uma perversão, mas quando o clericalismo entra nos leigos, é terrível”.
“Ser uma Igreja Aberta”, a indicação do Papa: “Redescobrir-se como corresponsáveis na Igreja não equivale a pôr em prática lógicas mundanas de distribuição de poderes, mas significa cultivar o desejo de reconhecer o outro na riqueza dos seus carismas e da sua singularidade.
Assim, podem encontrar um lugar aqueles que ainda têm dificuldades para ver a sua presença reconhecida na Igreja, aqueles que não têm voz, aqueles cujas vozes são abafadas senão silenciadas ou ignoradas, aqueles que se sentem inadequados, talvez porque tenham percursos de vida difíceis ou complexos. E muitas vezes são excomungados a priori”.
“Precisamos de comunidades cristãs nas quais o espaço se expanda, onde todos possam se sentir em casa, onde as estruturas e os meios pastorais favoreçam não a criação de pequenos grupos, mas a alegria de ser e sentir-se corresponsáveis”, é o retrato de Francisco.
“Nunca sem o Outro com ‘O’ maiúscula, nunca sem os outros com quem compartilhar o caminho”, o slogan utilizado pelo Papa: “Construir a Igreja juntos”, para o Papa, “é uma exigência urgente que sentimos hoje, sessenta anos após a conclusão do Concílio Vaticano II”. “Sempre está à espreita a tentação de separar alguns ‘atores qualificados’ que realizam a ação pastoral, enquanto o restante do povo fiel permanece apenas receptivo às suas ações”, é a denúncia. Para Francisco, “a Igreja deve deixar transparecer o coração de Deus: um coração aberto a todos e para todos”. Daí a necessidade de um exame de consciência:
“Deveríamos nos perguntar quanto espaço abrimos e quanto escutamos realmente nas nossas comunidades as vozes dos jovens, das mulheres, dos pobres, daqueles que estão desiludidos, daqueles que na vida foram feridos”. Enquanto a sua presença permanecer uma nota esporádica no conjunto da vida eclesial, a Igreja não será sinodal, mas será uma Igreja de poucos”.
“Ser uma Igreja ‘inquieta’ nas inquietudes do nosso tempo”, a última proposta do Papa, que elogiou a Igreja italiana por ter escolhido, na fase do Caminho Sinodal que acaba de ser concluída, formar grupos sinodais também nas prisões. “A comunidade cristã é desafiada a sair dos preconceitos, a colocar-se à busca daqueles que vêm de anos de detenção, para encontrá-los, para ouvir o seu testemunho e a partir com eles o pão da Palavra de Deus”, o convite de Francisco, que espera que o Sínodo possa nos ajudar a “levar a sério a vulnerabilidade”.
O exemplo citado é o de Pe. Primo Mazzolari, que alertava contra os “padres que sufocam a vida”.
“Uma Igreja sobrecarregada pelas estruturas, pela burocracia, pelo formalismo, terá dificuldade para caminhar na história, ao passo do Espírito, ao encontro dos homens e das mulheres do nosso tempo”, começou o Papa, exortando a Igreja italiana a “continuar a caminhar”, deixando-se guiar pelo Espírito, que é “o verdadeiro protagonista” do Sínodo. “Humildade, desinteresse e bem-aventurança” os traços eclesiais já indicados como necessários na Convenção eclesial nacional de Florença em 2015:
“O Sínodo não é para buscar as opiniões das pessoas ou fazer acordos: o grande inimigo desse caminho é o medo”.
“Coragem e Unidade”. Esses são os trilhos pelos quais a Igreja italiana é chamada a caminhar, disse o cardeal Matteo Zuppi, arcebispo de Bolonha e presidente da CEI, na homilia da missa presidida na basílica de San Pietro. “A unidade é sagrada e não é por acaso que está sempre ligada à paz, porque a guerra começa quando se aceita a divisão, quando se provoca a divisão”, a tese de Zuppi, que no início da homilia definiu a guerra “uma máquina de guerra fratricida” e mencionou “a angústia que pesa na alma do povo ucraniano que anseia pela paz”. Não somos “funcionários anônimos”, mas “um grande povo, que acolhe todas as etnias porque são o povo santo de Deus”, é o afresco do presidente do CEI: “Na comunhão, ninguém fica desocupado, e ninguém é sem importância”.