Católicos e evangélicos: as diferenças e convergências sobre presença na política
As duas principais forças religiosas do país, católicos e evangélicos, possuem visões diferentes quanto à participação de seus membros na política eleitoral, embora ambas entendam que não se possa existir a instrumentalização da igreja visando obter ganhos nas urnas.
Por Anápolis ter sido uma cidade cuja história foi construída alicerçada na religião, a pauta é bastante presente nas campanhas. A busca pela dobradinha católico-evangélico – ou vice-versa – na chapa majoritária recebe mais atenção dos partidos do que a questão de gênero.
O presidente do Conselho de Pastores de Anápolis (CPA), bispo Mozart Morais, da Igreja Fonte da Vida, destacou a importância das eleições deste ano para as cidades de um modo geral e disse que como liderança religiosa, torce muito para que os vencedores sejam aqueles que tenham princípios cristãos e defendam a família.
Sobre a participação de pastores diretamente no processo, como candidatos, Morais disse que na sua igreja há sim um incentivo. “Já elegemos um deputado federal, que foi o Fábio Sousa, mas para o segundo mandato ele não foi reeleito por 3 mil votos. Há mais de 20 anos temos vereador em Goiânia. Ou seja, participamos sim”, afirmou o presidente do CPA em entrevista à Rádio Manchester.
Mozart Morais contou que a sua igreja não lançará candidatos em Anápolis neste ano, mas que vai ajudar irmãos que estejam no processo. Questionado se os evangélicos permitem que seja feito o pedido de voto no altar, o presidente do CPA ressaltou que se evita “ao máximo”.
“Não vou falar que a gente não faça. Quando recebemos uma visita, seja A ou B, mesmo que seja aquele que a gente não esteja apoiando, no mínimo oramos por ele e abençoamos”, explicou o líder religioso.
Morais comentou que o religioso não é bobo, ele conhece aquele que só entra nas igrejas em época de eleição. Ele chama esses de “aventureiros” e lembra que católicos e evangélicos sabem distinguir bem quem é cristão e tem os princípios da palavra de Deus.
O presidente do CPA explicou que os pastores orientam os fiéis na época das eleições, mas não se coloca “cabresto no pescoço” dos frequentadores da igreja, pois isso não é o correto. Além disso, revelou Morais, é preciso respeitar a ideologia de cada um – direita ou esquerda – considerando que existem bons candidatos nos dois campos.
Mozart Morais disse que tem sua preferência, o vice-prefeito Márcio Cândido (PSD), mas que se trata de algo pessoal, sem qualquer ligação com o CPA, que é apolítico. “Como presidente não posso de forma alguma trabalhar para A ou B, mas individualmente eu tenho a minha preferência, o que é normal”.
ORIENTAÇÕES
Ao contrário da igreja evangélica, a católica não permite que membros do clero sejam candidatos. O bispo auxiliar da Diocese de Anápolis, dom Dilmo Franco, ressaltou, também em entrevista à Rádio Manchester, que o envolvimento existe, pois o ser humano é um ser político por natureza, mas é preciso ter ciência como isso acontece.
“Algumas pessoas cobram de nós posições mais acirradas, pois às vezes olham representantes de outras instituições que lançam candidatos ou que fecham em um nome. Temos sempre que lembrar que a Igreja Católica se envolve da política dando orientações”, explicou o bispo.
A visão dos católicos é que o “ser cristão” está acima do “ser político”. “Reconhecemos o valor e a beleza daqueles que se envolvem na política para fazer o bem comum, mas temos que lembrar que tem uma hierarquia de valores no coração do ser humano. Então primeiro é o ‘ser cristão’, depois o ‘ser político’”, ressaltou dom Dilmo.
Para o líder religioso, a inversão desses valores que levou à polarização, provocando casos de familiares que deixaram de se falar por causa de questões políticas. “Então, o envolvimento da política acaba sendo uma pedagogia para que todos os fiéis também possam olhar que o ‘ser político’ está, vamos dizer assim, a serviço da identidade cristã, que é para fazer o bem”.
Cabe então aos padres, nas homilias ou palestras, falar sobre o candidato ideal, dar orientações, mas nunca citar nomes, demonstrando preferências. “Desde o tempo do seminário a gente já é orientado sobre as nossas posturas. Então ninguém pode dizer que não sabia, que desconhecia”, disse o bispo auxiliar.
“Nós não apresentamos um candidato, nós não fechamos em um partido, nós somente apresentamos as diretrizes segundo o olhar cristão, daquilo que é mais conveniente para o bem comum, para o bem das pessoas”, completou dom Dilmo.
O bispo reforçou que padres jamais podem se candidatar de acordo com o direito canônico, mas caso tome de fato essa decisão, será suspenso do ministério. Ou seja, não se pode exercer as duas coisas juntas. Já o diácono permanente deve conversar especificamente com o bispo sobre a situação.
“O bispo pode liberar o diácono para que ele se candidate e assim pode suspendê-lo também do exercício diaconal ou proibir, como já aconteceram casos, de que se candidate porque vai acabar instrumentalizando a religião”, explicou dom Dilmo.
É nesse ponto que o líder católico chamou a atenção. “O que a Igreja Católica coloca nesse sentido da política e da fé é que jamais instrumentalizemos a religião a serviço de um ou de outro partido”. Segundo ele, se isso for permitido, a instituição acabará perdendo a credibilidade.
O bispo disse que no caso de surgir o interesse de se dar uma formação política para os fiéis – e vários candidatos procurem a igreja – pode existir a possibilidade de se reunir todos em um espaço e cada um deles falar de propostas e projetos. A missa não é local para isso. “Ninguém vai à missa para ouvir candidato falar ou para ouvir o padre falar sobre um determinado candidato, seja falando bem ou seja falando mal”.
Dom Dilmo disse ainda que não se proíbe o boca a boca de fiéis, desde que isso não aconteça na porta da missa. “Agora, veja bem, quando a pessoa é da paróquia, ela naturalmente está nas pastorais, então, naturalmente, ela tem o direito de como cidadão fazer a propaganda dele ali, conversar e etc, porque ele já é membro da comunidade”.